domingo, 7 de março de 2010

Lendas reais não urbanas: Arlindo século XXI

Em cena: Arlindo século XXI
(O texto é uma grande fala; tudo entre aspas, pois)

"Eu acordo depois de dez horas dormindo, mas mesmo assim com sono. Há cinco anos atrás, quando o tempo passava mais devagar que hoje, bastavam-me seis, sete horas para acordar com plena disposição. Mas hoje em dia é essa sacanagem, pois são necessárias doze, treze horas para que eu acorde bem. Assim que levanto eu bebo café. Sem rum. Com rum às vezes, nem sempre. Ligo o rádio, mas tudo é ruim. 'Baú da música' na rádio x, canto gospel na rádio y, futebol na rádio z. Foda-se, desligo a merda rádio. Saio pra comer; não tem comida em casa; nunca tem comida em casa. Quando chego na padaria descubro que esqueci a carteira. Volto em casa, mas não pra pegar a carteira. Desisti de comer. Foda-se de novo. Durmo de novo. Acordo algumas horas depois e sento no computador. Estou com trabalho acumulado, mas foda-se (de novo), eu sou o cara, eu sou o gênio (geniozinho, ok). Não faço trabalho, fico vendo vídeo no youtube. Eu amo youtube. Depois entro no facebook e jogo alguns joguinhos de passatempo. Quero tudo, menos sair de casa. Ao meio-dia chega o inevitável: tenho de sair de casa pra trabalhar. Chego no trabalho e um babaca comenta da minha barba. Pergunta se sou lenhador, e eu respondo perguntando se ele é viado. Tenho certeza que aquele cara é viado. Sento na minha mesa e fico olhando pra gostosa da mesa da frente. Ela me olha às vezes, mas provavelmente pra reprimir minha barba. Foda-se de novo e de novo. Eu paro de olhar pra ela, mesmo sabendo que quero comê-la. Paro de olhar porque eu sou o prêmio. Pergunto pra mim mesmo que horas devem ser. Eu não ando de relógio. Odeio relógio porque quando tinha um eu simplesmente não parava de olhar pra ele. E para as horas, consquentemente. Saio do trabalho depois de algum tempo de tédio e volto pra casa. De noite o pessoal do colégio me liga pra sair. Eu não quero sair. Mas eles insistem. Eu gosto deles, mas eles não pensam em outra coisa: sair, sair, sair. Foda-se eles. Mas foda-se eu também, vou sair dessa casa cheia de poeira. Vou conhecer gente, me entrosar, conversar... Que coisa escrota que eu tô falando agora. Sei que não farei nada disso. Sei que vou embora depois de uma hora e meia no máximo. Mas assim mesmo eu vou. Com o pessoal reunido, as risadas são inevitáveis. Mas as minhas risadas têm um toque de veneno, de pena mesmo. Eles não sabem de nada da vida, mas o pior de tudo é que acham que sabem. As mesmas estorinhas, as mesmas mentiras imbecis que todo mundo sabe que é mentira. É, tem gente que não se corrige. Depois de meia hora dentro da boite, decido me aproximar de uma mulher. Vontade repentina. Chego em uma e mando a clássica: 'pode me chamar de Lindo, pois o ar você já me tirou todo'. Admito que sou bom com mulheres. Elas devem me achar engraçado. Não me conhecem nem um pouco, claro. Acabei pegando aquela menininha. Começamos a conversar, e então a vontade de matá-la começou a aflorar. Ela não falava nem uma palavra que não me irritasse. Falei que iria ao banheiro rapidamente. Fui ao caixa, paguei a conta e peguei um táxi até em casa. Chegando em casa, abri uma cerveja e vim escrever. E aqui estou me despedindo, pois estou com sono. Dormi muito mal noite passada."

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4 comentários:

  1. Belo texto, belo texto, gostei bastante também.

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  2. Gostei dessa frase, sobretudo: "Ela me olha às vezes, mas provavelmente pra reprimir minha barba".

    Bem empresarial, essa questão da barba, bem no cerne da questão.

    Ah, e tira essa verificação de palavras. Qual é o sentido disso afinal?

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  3. Obrigado companheiros Fernando e Moreira. Usei algumas questões, como a empresarial e a da auto-exclusão também. O que é corriqueiro no meu caso. Usei outras questões babaquinhas afim de desmascará-las. que fizeram o texto ficar ao gosto de vocês. Que bom que gostaram.

    Já tirei a verificação de palavras, companheiro Moreira. Realmente, era inútil, só que eu tinha esquecido de tirá-la apenas.

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